This is a house

Feitas com material importado, casas brasileiras ganham ar de seriado americano

Aida Veiga


Escada na porta de entrada e tijolinho aparente na fachada: meio lá, meio cá

Piso e parede sem juntas na cozinha e revestimento externo de vinil: plástico por toda parte e manutenção mais prática

Sabe aquelas casas de dois andares, laterais de madeira clara, escadinha na entrada. típica dos filmes e seriados americanos? Pois aos poucos elas começam a ser vistas na paisagem do bairro do Brooklin, em São Paulo, da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, e em cidades de veraneio, como Atibaia e Campos do Jordão. Chamada de casa industrializada, ela troca o tijolo, o piso de tábua e a telha tradicional por muito plástico, gesso e fibra de vidro exatamente os materiais que compõem 60% das casas nos Estados Unidos. Com isso, perde-se em sofisticação e solidez. Mas ganha-se em mão-de-obra, tempo de construção e, depois de pronta, em simplicidade na manutenção. "É a globalização que chegou ao canteiro de obras", diz Claudio Conz, presidente da Associação Nacional dos Comerciantes de Material de Construção, Anamaco. "Os novos materiais são a forma mais fácil, rápida, limpa e barata de construir."

Na casa com jeito de house, a construção inteira, dos alicerces ao telhado, é facilitada (veja quadro) - de complicado mesmo só a pronúncia dos nomes dos materiais todos, que obriga de pedreiros a arquitetos a dobrar a língua. A cobertura é feita de shingle, uma placa fina de fibra de vidro revestida de asfalto, em cores variadas, muito mais resistente que a boa, velha e quebradiça telha. Não acrescenta nada à aparência da casa, mas, em compensação, adeus goteiras. Nas paredes, nada de tijolo, massa ou lixa. A dry wall americana é de gesso encapado com um tipo de papel grosso, impermeabilizado e tratado. É comprar uma das três medidas padrão, encaixar, passar uma demão de tinta e pronto. Do lado de fora, a vedete é o siding, que na casa da família Walton, do antigo seriado de TV, era de placas de madeira justapostas, mas hoje é de vinil (um tipo de plástico) e vem em painéis prontos para montar e encaixar. Nos seus 25 anos de garantia, asseguram os fabricantes, o máximo de manutenção que exige é lavar de vez em quando com uma mangueira. "A grande vantagem desse tipo de casa é a praticidade, tanto para quem constrói como para quem mora nela", resume o arquiteto Aristides Mariutti Filho, dono de uma empresa que, em dois anos, já ergueu quase trinta moradias do gênero.

Nos banheiros e cozinhas dessas construções, placas finas de plástico substituem os azulejos e um carpete de vinil recobre o piso, sem juntas nem emendas. As janelas e as portas externas também são de vinil e têm double glazing, um vidro duplo, sem frestas, que não deixa passar frio nem calor. Por trás das paredes de gesso colocam-se canos pex, obviamente de plástico, que são maleáveis e fazem curva, sem necessidade de conexões. Mesmo feita quase toda de material importado, a casa à americana sai por preço equivalente à de alvenaria. Primeiro porque é leve - só em cimento, vigas, lajes e pilares, a economia no custo da estrutura é de 13%. Até com entulho se poupa: os gastos caem pela metade com a compra de material sob medida. Ganha-se também no prazo de entrega, bem menor, pois a montagem é fácil, rápida e acessível a qualquer pedreiro habilidoso.

Verão difícil

Nem tudo o que é bom para as casas americanas, porém, preenche os gostos e as necessidades dos brasileiros. As dry walls, por exemplo, são praticamente ocas e exigem uma boa camada de lã de vidro para garantir o isolamento termoacústico. "Senão, dá para ouvir o barulho do encanamento e a conversa do vizinho", diz o engenheiro civil Paulo Martins Pereira Neto, que pesquisa material de construção na Universidade de São Paulo. Nos Estados Unidos é costume forrar com lã de vidro só as paredes dos quartos. Aqui, os clientes exigem forro em todos os cômodos. Sem falar nas paredes externas, que têm de ser de concreto mesmo - as de gesso sucumbem a umas poucas marteladas e não passam no teste da justificada obsessão brasileira por segurança. Outro problema é a temperatura de uma casa planejada para invernos rigorosos, em que as paredes retêm calor e o telhado não faz sombra. "Neste inverno, está sendo ótimo para meu filho, Gustavo, de 3 meses", conta Sibele Vilches, comerciante que mora numa casa dessas há sete meses. "Mas, no verão, eu penei." A solução dos Vilches foi abrir a carteira e mandar instalar ar condicionado central.

Construtores e importadores torcem para que, bem adaptados aos gostos locais, os novos materiais vençam uma espécie de preconceito nacional contra inovações no setor, estimulado pelo desastrado lançamento, há vinte anos, das casas pré-fabricadas, que na época eram feias, malfeitas e mal-acabadas. "Todo mundo quer construir rápido e barato", afirma a engenheira Eleana Patta Flain, professora de materiais e técnicas de construção da Universidade Mackenzie, que está ensinando sobre as novidades em suas aulas. "Só que o brasileiro ainda sonha com uma casinha de alvenaria." Talvez por isso mesmo, uma, característica das construções ao estilo americano no Brasil seja a fachada coberta de tijolinho aparente, igualzinha à casa da vovó.


veja 16 de junho, 1999 p. 103
Fotos Andrè Fortes